O CASAMENTO NÃO É APENAS A UNIÃO DE DUAS PESSOAS POR UM ATO DE AMOR
O que faz com que um casamento dure na saúde e na doença, na infelicidade e na bonança, na falta e nos excessos? Quando observamos as distonias em muitos casais, vistos como exemplares, costumamos nos questionar sobre os propósitos de vida destes indivíduos, representando papéis ambíguos de formas tão convincentes. Pouco ou nada sabemos do que acontece na vida destas pessoas que justi? que a manutenção de um casamento pensado intolerável ou infeliz, sobrevivendo a tantos infortúnios. Sabemos que o casamento não é apenas a união de duas pessoas por um ato de amor. Acreditamos que mesmo quando o amor se sobressai, ele traz no cerne outros sentimentos de igual força e intensidade. A agressividade, a violência, o desprezo e a indiferença são sentimentos que quando a? oram podem transformar-se numa luta de mágoas e ressentimentos.
Sabemos que homens e mulheres que se uniram sob este acordo amoroso acham difícil entender como chegaram a esse ponto, vivendo sob o mesmo teto. Transformado num contrato de risco, em que as separações enfraquecem as esperanças e a con? ança, o casamento moderno parece viver da efemeridade de tudo e, com o passar do tempo, transformar esse projeto mútuo de felicidade em um simples viver por viver. A sociedade ainda não se deu conta de que um acordo apoiado nas paixões tem a duração das chamas que os aquece. Infelizmente, um casamento rompido ainda é visto como um fracasso. Não dizemos que foi bom enquanto durou ou que aprenderam e cresceram com esta experiência. Preferimos atribuir a um e outro, ou a ambos, a culpa por suas di? culdades. Uma separação desejada e assumida é ainda incomum e um divórcio amigável uma raridade. Dinheiro, bens e ? lhos fazem parte desse pacote de desencantos e frustrações.
Sabemos que nem todo casamento se apóia no amor. Alie-se a isso o crescimento pessoal e pro? ssional, a construção da família, a con? ança e segurança de saber-se realizados e capazes de sobreviver ao caos instalado. Assim como o casamento não nos conduz ao Nirvana, também as separações movidas por desgastes pessoais ou econômicos não abrem espaços tão compensadores. Separações propiciam o recomeçar com novos parceiros e são possíveis e desejáveis, mas não existem garantias.
Embora, a cada dia que passa, as separações venham se tornando comuns e o divórcio uma ruptura legal, o conceito do casamento para toda a vida permanece. Esse talvez seja o grande con? ito que força homens e mulheres, à beira das separações, se verem como adversários que devem carregar a culpa pelo “fracasso”, uma falha para o qual não se adotou nenhum provimento. É assim que um divórcio resulta em famílias desestruturadas na quebra das responsabilidades inseridas num contrato de casamento. Apesar das di? culdades que envolvem as separações, nossa compreensão ainda é muito super? cial. Valores afetivos e outros de natureza moral, religiosa e econômica não devem ser esquecidos. Ninguém deve ser punido ou escravizado por erros cometidos numa relação mal estruturada. Hoje, com leis mais ? exíveis em relação a direitos e deveres, homens e mulheres se mostram mais corajosos para enfrentar estes problemas. A razão disso está no reconhecimento de que podemos sempre dar uma nova chance para corrigir os velhos erros.
Dr. Jorge Pfeifer é psicólogo, psicanalista, escritor e articulista.