RICARDO GUIMARÃES: “COMUNICAÇÃO É EXERCÍCIO DE IDENTIDADE”

Fernando Paiva | Publicitário

Fotos: Arquivo Pessoal | Divulgação

“QUANDO VIREI EMPRESÁRIO DE COMUNICAÇÃO, SENTI

NECESSIDADE DE DEFINIR O QUE ERA COMUNICAÇÃO PARA MIM”

THYMUS – 25/01/2010 – Ricardo Guimaraes, presidente da Thymus Branding.
Foto: Leonardo Rodrigues

O destaque de capa e matéria especial desta edição é Ricardo Guimarães, fundador e presidente da Thymus Branding – uma das maiores e mais conceituadas empresas de Branding e Consultoria Estratégica do Brasil. Desde 1998, dedica-se a despertar, formatar e manter as marcas com alto poder de interação com os seus mercados, capacidade de inovação com agilidade e performance superior sustentável, através das relações de qualidade que a marca e a organização estabelecem. Sua história profissional é pautada pela definição de “Comunicação como exercício de identidade”, o que o levou a criar a Thymus como uma consultoria estratégica para empresas que atuam em cenários de constante mudança, onde suas identidades e perenidade são colocadas em risco. Fundamentada no conceito de evolução e pragmatismo consciente, sua metodologia tem criado cases consistentes no mercado. Considerado pioneiro na introdução do Branding como abordagem de gestão, é referência do tema. A experiência e cases da Thymus têm sido citados em publicações nacionais e internacionais. Apoiou dois dos maiores cases de branding do Brasil: Natura, case study na London Business School, e Banco Real, case study na Harvard Business School, formatado pela professora Rosabeth Moss Kanter. Nesta entrevista exclusiva para a revista Cult, concedida ao publicitário Fernando Ferreira da Silva Paiva, ele fala da sua trajetória profissional, de comunicação, marketing e branding, estratégia de marcas, entre outros temas. Confira o bate-papo com Ricardo Guimarães.

Como você começou sua carreira na comunicação?

Comecei como estagiário na Norton num momento genial da agência. Neil Ferreira tinha ido para lá como diretor de criação e levou uma equipe de primeiríssima qualidade. Eram os chamados “Os Subversivos”. Tive sorte porque nossa turma de estagiários também era muito boa e isso marcou uma geração de criativos no mercado. Fui contratado lá e fiz carreira como redator da JWT e depois como diretor de criação da Proeme, da CBBA, da Apoio da Globo, criei a PPR para a JWT com o Jô Cortez e, em 1983, criei a Guimarães e Giacometti. Em 1989, o Dennis saiu e fiquei com a Guimarães. Em 1998, abri a Thymus e, em 2004, fechei a Guima.

Por que razão você deixou de trabalhar com comunicação publicitária e passou a se interessar por estratégia e cultura de marca? Quando e como se deu essa mudança?

Não foi de uma hora para outra. Tem uma história. Quando virei empresário de comunicação senti necessidade de definir o que era comunicação para mim. Assim, em 1983, “Comunicação como exercício de identidade” passou a orientar nosso trabalho. Na prática, essa definição impôs várias inovações no negócio de agência: a remuneração tinha que proteger a investigação e o trabalho sobre identidade do cliente então tinha que ser por FEE e não por comissionamento de mídia e produção, os profissionais não podiam apenas entender de mercado e comunicação, mas também de cultura organizacional, psicologia então tinha administradores, psicólogos, sociólogos; tivemos também que desenvolver metodologia para estudar a identidade e usar essa identidade como variável relevante na estratégia do cliente. Quer dizer, a Guimarães estava gestando um novo negócio que não era exatamente agência de propaganda. Um fruto típico dessa experiência é o case da Natura. No fim dos anos 1990, tirei aquela estrutura de dentro da Guimarães e batizei de Thymus Consultoria de Identidade, que depois fiquei sabendo que o que a gente fazia era Branding. O mercado respondeu muito bem e a Thymus começou bombando muito com clientes grandes e referenciais como a Globo, o Banco do Brasil, a Abril, o Banco Real, além da Natura que continuou. Enquanto isso, internet no ar, redes sociais se instalando iam minando a força e o prestígio da publicidade como era entendida até então. Aí entre reinventar a propaganda e criar um novo negócio que fazia muito mais a minha cabeça, fiquei com a Thymus. Deu tão certo que o branding virou moda e hoje todo mundo diz que faz branding. Não gostei da banalização e do wannabe branding que praticam, mas achei legal porque pelo menos chamou atenção para a questão da identidade cultural da marca e da comunicação. Hoje, a Thymus, com a liderança do Tiago Guimaraes, volta a implementar as estratégias com um modelo de parcerias alinhadas àquela metodologia e ferramentas embarcadas em tecnologia.

Como você enxerga o papel da comunicação hoje feita por agências de propaganda? Você concorda com o modelo tradicional, de agenciamento de conta? Qual a relevância desse modelo para as marcas?

Pois é, são dois assuntos – a publicidade em si e o negócio da publicidade; que são afetados por dois movimentos: a fragmentação da comunicação vinda da especialização e a integração da comunicação demandada pela transparência das redes sociais. Devemos ter bons modelos de negócio apoiados em um destes movimentos, embora um não poderá desconhecer a relevância do outro. A integração de meio, forma e conteúdo deve ser total para ganhar e manter a confiança das pessoas, não importa se é consumidor, funcionário, fornecedor ou canal. Confiança é o maior diferencial competitivo num cenário tão mutante, bem-informado e mal-informado como o atual, cheio de fake news. Portanto, tudo tem que ser alinhado, de modelo mental a modelo de remuneração, tudo que é relacionado à comunicação deve funcionar como um organismo só, mesmo que sejam CNPJs diferentes. Isto é, mais do que nunca “comunicação é exercício de identidade”.

Qual a importância das áreas de marketing e comunicação das empresas no processo de construção da estratégia da marca? Ou essa estratégia nasce somente da sua abordagem junto aos acionistas e C-level das empresas?

Hoje, a estratégia da marca nasce da relação entre a empresa/produto e o mercado. Tem que estar baseada numa realidade que sustenta a estratégia. Não pode ser algo que sai da cabeça criativa de alguém. Na verdade, qualquer pessoa bem informada sobre a empresa e seu mercado, que seja comprometida com o futuro e o resultado do negócio, pode acessar essa estratégia, mas para isso ela deve ser movida por um espírito crítico, empreendedor, capaz de ver o potencial da empresa resolver problemas da sociedade com eficiência e originalidade. O marketing é fundamental, mas pode não ser suficiente dependendo da empresa, seu porte, se é familiar, capital aberto, tipo de mercado, etc. Importante entender que a marca representa a relação entre a empresa e o mercado. Ela não é um nem o outro. Por isso que não existe valor de marca descontextualizado de uma circunstância. Antigamente, o marketing pesquisava o mercado, fazia um bom produto, uma boa campanha e vida que segue. Hoje, se não estiver apoiada por um fluxo constante de informação entre a empresa e o mercado que alimente sistematicamente a atualização, inovação de produto, canal, atitude, etc, seu posicionamento não se sustenta. Veja o comentário do Jorge Paulo Lemann sobre esse tipo de estratégia de marca apoiada exclusivamente em publicidade e marketing. Precisa cultura que suporte o ritmo de criação de novas experiências.

Como você vê a transformação que acontece hoje na mídia? Você observa uma perda de relevância de mídias tradicionais como TV, rádio, revista, jornal e outdoor em relação às mídias digitais neste processo de construção de imagem de marca?

A história das mídias mostra que sempre que surge um meio novo há um reposicionamento e ressignificação das mídias anteriores. Não acho que é perda de relevância necessariamente. O surgimento da fotografia promoveu a ilustração a arte.

Qual a importância da comunicação institucional para posicionamento e manutenção das marcas? Como uma empresa focada em estratégia de marca, como a Thymus, aborda e orienta esse tema nas conversas com seus clientes?

A ideia de comunicação como exercício de identidade sempre nos levou a tratar marca corporativa, cultura e negócios como aspectos diferentes da mesma identidade. Daí a consistência de nossos cases. Comunicação permeia esses três aspectos e um reforça o outro. Quando comunicação fala uma coisa, a cultura é outra e negócios outra, a conta não fecha. Chega uma hora a empresa tropeça no próprio pé.

Qual a diferença básica entre marketing e branding? Você considera que o termo branding hoje perdeu seu sentido original? As pessoas entendem realm

ente o conceito?

Legal explicar isso melhor. O Branding traz a invariável IDENTIDADE cultural como ingrediente fundamental da estratégia da marca. O marketing nunca precisou se preocupar com isso, porque bastava olhar para o mercado. Daí surgiu o branding junto com a relevância crescente da marca corporativa e da maior valorização dos ativos intangíveis da empresa. Só que, em algumas empresas, o branding ficou dentro do marketing, o que reduziu seu escopo. Outras empresas entenderam que era comunicação institucional. Na verdade, branding deveria se relacionar com o marketing da mesma maneira que marketing se relaciona com vendas que, aliás, tem confusão até hoje. Tem empresas em que Marketing se reporta a Vendas. Branding é sobre gestão estratégica de ativos intangíveis, todos relacionados à identidade como cultura,

relacionamentos, reputação, conhecimento, marca, etc.

Por que marcas que, por muitas décadas foram bem-sucedidas, estão morrendo ou perdendo a relevância?

Provavelmente porque não tinha o lastro de uma identidade cultural que as sustentassem nestes tempos de transparência e agilidade de inovação.

Qual é a saída pra evitar que isso aconteça?

Trazer a identidade cultural para agenda estratégica da empresa, entender a relevância de ativos intangíveis para a perenidade do negócio e integrar tudo a partir de um DNA.

Por muito tempo as empresas buscaram construir declarações institucionais no modelo missão-visão-valores, principalmente indo na onda de algumas consultorias de gestão. Hoje se fala muito em crença, propósito, essência. Grande parte das startups já assistiu o vídeo do TED

do Simon Sinek em que ele fala sobre o “Golden Circle” e usam este modelo para definir seus propósitos inspiradores. O que você pensa disso tudo?

Acho bom, mas precisa tomar cuidado para não ficar só nas palavras novas. Estamos deixando para trás aquele idealismo babaca e cínico da Visão, Missão e Valores do século XX para entender que neste novo cenário o pragmatismo tem melhores respostas para uma empresa sobreviver e se dar bem. Por exemplo, o propósito, que só ganha a compreensão certa se ficar claro que a empresa é um sistema vivo. Porque, como todo sistema, tem que ter um propósito, que é algo necessário para que as partes que o compõem funcionem de maneira coesa e eficiente. Não é opção. Não é um texto para fazer endomarketing e por na parede. É imperativo para a sobrevivência do sistema. Isso é teoria de sistemas.

Pequenas e médias empresas também precisam de uma estratégia de marca estruturada? O que elas devem fazer?

Em geral toda empresa pequena ou média tem uma estratégia, mas nem sempre está estruturada e compartilhada por todos. Quando o fundador está presente, ele não sente necessidade porque está tudo na cabeça dele. Mas, com o tempo, ele vai sentir que a empresa poderá crescer mais rápido e melhor se o DNA do negócio estiver mais compartilhado.

Qual o segredo da perenidade de algumas marcas?

Ser gerenciada como um sistema vivo dentro de um ecossistema com o qual ela interage permanentemente para se manter atualizada, gerando benefícios e se beneficiando de todas as relações. Nesta dinâmica, o ecossistema garante a perenidade da marca. Se esta relação não for boa, o ecossistema elimina a marca e tudo que está por trás dela, assim como a natureza que elimina tudo que não tem saúde e não contribui para a saúde do ecossistema.

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